A review by sara_m_martins
António Variações. Entre Braga e Nova Iorque by Manuela Gonzaga

informative inspiring reflective medium-paced

5.0

 “Porque a história deste homem singular é um ex-libris da nossa História recente. A sua vida ilustra a realidade portuguesa da segunda metade do último milénio”

Em “António Variações: Entre Braga e Nova Iorque”, Manuela Gonzaga faz uma homenagem a esta “ave rara”, como é muitas vezes descrito nesta obra, da história cultural portuguesa. Um ser que criou um percurso e uma arte tão única como ele, Entre Braga e Nova Iorque.
Esta biografia é a história da vida do António, mas também a História da vivência portuguesa na segunda metade do século XX. A escrita de Manuela Gonzaga põe-nos nessa “terra sangrada de gentes, em perpétua diáspora”, ao seguir o percurso do António, primeiro do Minho para a metrópole lisboeta, de Lisboa para o resto do Mundo, e de volta novamente. Um mundo de gentes que continuam a procurar o seu lugar.
Apesar de, naturalmente, se guiar pelo tempo linear, Manuela segue o fio da história, misturando referências e vivências passadas e futuras, enquadrando quem era António Joaquim Ribeiro.
Este percurso de vida individual anda de mãos dadas com a vida em Portugal; por exemplo, seguimos os trabalhos de António, vendo desde mercearias até à noite lisboeta (de onde se realça a cultura queer portuguesa, uma História não facilmente disponível, e que adorei aprender), passando por cabeleireiros e, claro, muito do mundo da música.
O mundo da música, onde o António tanto queria estar e que tão pouco aproveitou - não por mau aproveitamento do tempo em que lá esteve, não por falta de tentativa, mas porque infelizmente Variações se junta a essa massa de pessoas retiradas à vida pela epidemia dos anos 80 (e que nos testemunhos da família, recolhidos em 2004/2005, se vê a necessidade de afastar o António desta doença*). Talentos perdidos para a terra, insuportável para tentar contabilizar.
*Um livro criado com testemunhos, torna-se necessariamente um livro complicado, mas também muitíssimo mais interessante. Tentar juntar as ilustrações de António, o melhor e o pior, as discrepâncias entre diferentes pessoas da vida de Variações, criando uma imagem da personagem que escreveria canções como o “Estou Além”.

Este “provinciano, mais animal que racional, anarquista, pacifista, curioso, insatisfeito, que sente o direito a existir porque respeita a existência dos outros”, que “tem vontade de ficar na História, nem que seja na História de uma parede de casa de banho” é homenageado como deve ser, tal como é o país que o abraçou e que o abraça ainda.